A Câmara de Foz realizou um debate nesta quarta-feira, 05 de novembro, a respeito do Estatuto Municipal da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA), fruto do Projeto de Lei em trâmite na Casa (PL n° 87/2025).

O proponente do debate, vereador Sidnei Prestes (Mobiliza), destacou que em Foz “há preocupação com a demora no diagnóstico, a falta de terapias e a necessidade de professores de apoio nas escolas”. Além disso, ele também falou que persiste o estigma e falta de compreensão da sociedade das pessoas com TEA.

Após um intenso debate que expôs necessidades e realidade enfrentada pelas pessoas com TEA e seus familiares na busca por laudo, terapias e demais condições necessárias para desenvolvimento da pessoa com a condição, o vereador Sidnei (Mobiliza) falou sobre o seu projeto “Cidade do Autista”, inspirado na cidade de Sorocaba. “Nós não queremos tirar o centro da juventude, nós queremos implementar mais atividades lá. Dar oportunidade para os autistas da nossa cidade, para as crianças e para as famílias. Ser um espaço de acolhimento de grande benefício para as pessoas autistas da nossa cidade”.

Estiveram presentes os vereadores: Paulo Debrito (PL), que abriu o debate; Soldado Fruet (PL); Evandro Ferreira (PSD); Valentina Rocha (PT) e Dr. Ranieri Marchioro (Republicanos).Também marcaram presença: Silvana Garcia, Secretária Municipal da Educação representando o Poder Executivo; Fábio de Mello, Secretário Municipal da Saúde; Rafael Arguello, Procurador Geral do Município; Michieu Platini de Oliveira, Presidente da Aspas; André dos Santos, representante da Secretaria Municipal de Assistência Social; Carlos Azevedo, presidente da Comissão de Pessoas com Deficiência e Idosos; Athos Florêncio, Relações Públicas da ACDD e Danilo Nogueira Costa, Agente da Polícia Federal.

Exposições e ponderações

Durante o debate, diferentes abordagens e necessidades das pessoas com TEA foram apresentadas. Daniele Alves da Aparecida, psicopedagoga e mãe de autista, questionou a ADI 7796 que tramita no STF com a ideia de encerrar escolas especiais no PR. Também o PL 12686 do Governo Federal que acaba extinguindo as classes e escolas especiais. “Isso é segregação. Quem vive o autismo sabe que não é. A matéria coloca que todos, de todos os níveis, têm que estar na escola regular. Mas não é assim, isso não é viável”, disse. “A classe especial e as escolas especiais funcionam sim, desde que tenha a capacitação correta. Eu peço que escutem os pais e os professores. Imaginem como vão ficar as nossas crianças que serão colocadas em escolas regulares da noite para o dia”.

Fátima Schons, servidora da secretaria de educação, abordou um pouco do diagnóstico de autismo em adulto: “Eu vim aqui falar dos adultos autistas. Já entendemos a necessidade de ter esse diagnóstico precoce, para que a criança chegue à vida adulta com o nível 1 de suporte. Para as empresas, a única adaptação que ela precisa é de empatia humana. Para o poder público, acredito que muitas das adaptações não são de cunho financeiro e material, mas sim de empatia humana”.

Aline Milanêz Ribeiro, advogada em causas de defesa dos direitos das pessoas com TEA, pontuou: “Quero falar sobre o código estadual da pessoa autista. Ele já está implantado desde 2024. Minha sugestão é que esse projeto caminhe junto do código, pois devido à sua implementação, ele será obrigatório. Então, esse projeto de lei pode se conciliar com ele, já que trata de todos os direitos”.

Kalyne Medeiros de Lacerda, médica neuropediatra, falou sobre o atendimento remoto: “Mesmo de forma remota, é possível o atendimento neurológico para entender e avaliar a linguagem da criança, sempre considerando a faixa etária. Temos todos os recursos para realizar um atendimento adequado e focado no paciente, mesmo de forma remota”.

Posicionamentos sobre a proposta do Estatuto para pessoas com TEA no município

Ivonete Terezinha Bento, neuropsicopedagoga e professora da educação infantil, disse: “Esse projeto é um marco necessário para que a inclusão deixe de depender da boa vontade de alguns e se transforme em direito garantido e estruturado. Receber o diagnóstico de um filho com autismo, é enfrentar um verdadeiro turbilhão de sentimentos: amor, medo, incerteza e muitas vezes solidão. Não se trata de romantizar; é preciso compreender a complexidade desse momento e a necessidade de apoio, acolhimento e políticas públicas que garantam dignidade e inclusão para essas famílias. As famílias me dizem: não sabemos onde buscar ajuda, ninguém nos orienta e estamos cansados”.

Diego Venera, fonoaudiólogo especialista em terapia intensiva transdisciplinar, acrescentou: “A criação do estatuto é um passo importante, ele representa mais que um texto legal, ele é um marco de reconhecimento e compromisso com a inclusão e dignidade das pessoas autistas. Já temos leis federais, mas é aqui no município que as leis se tornam realidade. Por isso o estatuto é fundamental para transformar políticas públicas em ações para aqueles que realmente pesquisam. É essencial que esse estatuto não fique apenas no campo de intenções, precisamos transformar esses princípios em ações práticas com metas, indicadores e estruturas permanentes de atendimento. Cada vez mais crianças são diagnosticadas com autismo e isso é uma conquista da informação e da consciência social. Porém, o diagnóstico sem suporte é o mesmo que abrir uma ferida sem oferecer tratamento. Então precisamos focar mais em atendimentos e identificação precoces. O cérebro de uma criança que recebe o diagnóstico aos 2 anos e aos 7 anos não é o mesmo. Quanto mais cedo, melhor a intervenção e sua evolução”.

Ações na secretaria de saúde

Caroline Ribeiro falou das ações na Secretaria da Saúde. “Implantamos a linha de cuidado das pessoas com TEA agora em outubro. Na rede de atenção básica, tivemos a implantação da comissão de fluxos para atendimento da pessoa com deficiência em Foz. Também contamos com a implantação do M-CHAT, que é o rastreio para o transtorno. Temos trabalhado na ampliação do número de vagas para expandir o atendimento e as equipes”.

Necessidades da atenção especializada em saúde: neuropediatras, reforma CER IV e carro adaptado para transporte de pacientes

Com relação à atenção especializada, Nelson Trindade, falou sobre a regulação de vagas de reabilitação intelectual e comentou da tentativa de ampliação de mais equipe de atendimento multidisciplinar. “ Temos dados estimados das pessoas com TEA atendidas em Foz: Cer IV – 496; 137 na Nosso Canto; na ACDD são 150 e na APAE são 190 pacientes. Totalizamos mais de 30 mil atendimentos às pessoas com TEA em Foz”. Outro ponto relevante abordado foi a deficiência de neuropediatras no município. Ele também mencionou o pleito para aquisição de mais um carro adaptado para transporte de pacientes com deficiência e a reforma da estrutura predial do CER IV.

Conselho municipal da pessoa com deficiência e necessidades das pessoas com TEA

Leonardo Lugon, representando o Conselho municipal da pessoa com deficiência, comentou sobre a subnotificação das pessoas com TEA. Pelos dados oficiais, em Foz seriam 4 mil pessoas, mas o dado real seria de 7 mil. “Quero destacar a necessidade de planejamento para executar o que precisamos: “médico, terapia, assistência social. É necessáro ampliar o serviços públicos a PCD e não retroagir nos direitos”.

Relato pessoal

Diego Salvador Andrade, representante do grupo dos autistas adultos de Foz, disse: “Sou morador dessa cidade, cadeirante, autista nível de suporte 2, tenho TDAH grave e deficiência visual. No entanto, sou estudante de medicina na Unila. Hoje não venho aqui para pedir privilégio, venho pedir respeito, segurança e dignidade. Não só por mim, mas por todas as pessoas autistas e a suas famílias. Infelizmente a luta não se encerra com o fim da fase infantil e da adolescência; ela continua na fase adulta. A realidade em que vivemos, a pessoa autista adulta em Foz do Iguaçu, é sem proteção sensorial. Quem vive isso sabe o que eu digo: são diversas motos com escapamentos barulhentos, som automotivo alto próximo a residências em horários diversificados, além de ruas sem redutor de velocidade para veículos em alta velocidade fazendo barulho e a falta de faixa de pedestres. Estamos pedindo respeito. Cada ruído intenso pode nos causar desorientação, crises severas, dor física e até mesmo autoagressão. Nós não estamos pedindo silêncio total, estamos pedindo condições humanas de convivência. O que falta não é tecnologia, é empatia, e muitas vezes, vontade política”.